Livro retrata testes da CIA com paranormais para espionagem
Quem nunca teve um pressentimento inexplicável ou a sensação de trocar pensamentos com alguém sem estar em contato direto com essa pessoa?
Pois o governo americano, em meio à paranoia da Guerra Fria, passou décadas tentando explorar em operações secretas o que se convencionou chamar de “percepção extrassensorial” —algo que os céticos desprezam como pseudociência.
Essa é a história retratada no livro “Phenomena” (“Fenômenos”, sem publicação no Brasil), recém-lançado nos Estados Unidos.
Escrito pela jornalista Annie Jacobsen, ele começa na Segunda Guerra Mundial (1939-1945), com o interesse do Terceiro Reich pelo sobrenatural. Com a derrota alemã, os interesses ocultistas dos nazistas passam a americanos e soviéticos, que por sua vez foram se tornando paranoicos a respeito.
Duas preocupações eram mais prementes. A primeira era a de espionagem por meio de algo que eles chamavam de “visão remota”, em que uma pessoa com habilidades especiais de algum modo se projetava para algum lugar e obtinha impressões, sem jamais ter estado ali.
A segunda era a de ataques por telecinese, ou seja, ações em que alguém usa a mente —e nada mais— para sabotar ou destruir algum equipamento inimigo.
Se houvesse algum meio de isso ser verdade, os americanos não poderiam correr o risco de deixar que os soviéticos dominassem esse tipo de “tecnologia”.
Jacobsen, então, detalha o programa de “visão remota” do governo americano, criado em meados dos anos 1970 e chamado Star Gate, baseado sobretudo em pesquisas realizadas pelos físicos Russell Targ e Harold Puthoff, no Instituto de Pesquisa de Stanford, na Califórnia.
O livro nos conduz por personalidades famosas que tiveram relação com o programa, como o americano Ingo Swann (ligado a supostas experiências fora do corpo) e o israelense Uri Geller (conhecido por supostamente entortar colheres com a mente), além do astronauta Edgar Mitchell (que esteve na Lua com a Apollo 14, em 1971, e conduziu no espaço um experimento de telepatia com cartas —sem sucesso).
A narrativa é construída a partir de documentos, antes secretos e agora liberados pelo governo americano, e de entrevistas que Jacobsen fez com diversos envolvidos.
Agora, o que o leitor realmente vai buscar no livro é a resposta à grande pergunta: existe mesmo esse negócio de percepção extrassensorial?
Nesse sentido, a narrativa tenta ser agnóstica, mas tende a tratar o fenômeno como verdadeiro.
Entre os casos relatados estão um em que os “visores” conseguiram prever o sequestro de um oficial do Pentágono dias antes que acontecesse, em 1981, e outro caso em que uma “visora” soube dizer em que cidade americana estava escondido um fugitivo do FBI, em 1989.
Esses casos mais agudos, contudo, eram bem raros e de pouca utilidade para o serviço de inteligência na maior parte das vezes.
E, obviamente, o livro não trata das incontáveis vezes em que os “visores” caminharam na direção errada.
Um relatório da CIA, datado de 1975 e citado por Jacobsen, oferece a seguinte conclusão: “Um grande corpo de evidências experimentais confiáveis aponta para a conclusão inescapável de que a percepção extrassensorial existe como um fenômeno real, embora caracterizada pela raridade e pela falta de confiabilidade.”
Depois de passar décadas explorando o uso de fenômenos paranormais na tentativa de obtenção de inteligência, a CIA encerrou as atividades de “visão remota” em 1995, embora muitos dos documentos ligados ao programa ainda estejam fora do alcance do público.
Talvez a história definitiva do programa Star Gate ainda esteja por ser escrita. Mas o trabalho de Jacobsen oferece uma janela incrível sobre a época em que o governo americano achou que a paranormalidade pudesse servir à espionagem.
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